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PARTE 2: Uma resposta nunca vem só

Agora já podes ler toda a história que inclui as tuas sugestões!


Mas uma resposta nunca vem só. Com ela vêm mais dúvidas e interrogações. Pois foi isso que aconteceu na minha livraria. Ora escutem, não adormeçam já!

Quando o senhor Liácio pronunciou o título do tal livro dos gatos, abriu-se com enorme estrondo uma porta escondida nos fundos da livraria. Era uma porta de madeira carunchada esquecida por todos. Na verdade, nunca ninguém soube da chave nem para onde a porta iria dar. Seria uma passagem secreta?

Foi o senhor Liácio quem primeiro reagiu aproximando-se cautelosamente da passagem escura que a porta, agora semiaberta, deixava antever.

– Shhhh, estão a ouvir? Estão a ouvir alguma coisa? Shhhh… ssshhhhiu…

Nada. Ninguém ouvia. Os dois amigos, das tranças e das sardas, só escutavam o bater nervoso dos seus corações – Tum-tum! Tum-tum! – enquanto as mãos trementes da menina Nela acalmavam o pelo eriçado do Maravilhas que saltara para o seu colo: fsss, fsss, sibilava o gato. Mas que equipa de detetives aquela!

O senhor Liácio avançava pé ante pé, curvado no medo, e repetia:

– Shhhh, estão a ouvir alguma coisa? Estão a ouvir? Shhhh… Esperem, parece-me que ouço… ouço… passos… sim, estou a ouvir passos! Escondam-se, depressa, depressa!

A menina Nela, engasgada com o nervoso, gaguejou:

– Mas, mas…não será melhor pedir ajuda?

Nem teve tempo para responder. Ali estava uma figura imponente, de casaco e chapéu pretos e felpudos (ui, seria pelo de gato?). No ombro, um papagaio verde. O papagaio palrou com voz rouca:

– Livros! Livros! Queremos livros! Livros! Livros! Queremos livros!

Depois, a voz da misteriosa figura gigante:

– Não te lembras de mim?

O Liácio tremeu a cabeça. Quem seria este ser fantasmagórico? Seria um ladrão, um sugador de letras? O Alexandre, seu concorrente invejoso? A vizinha Odete, com o seu papagaio ou a alma da D. Antonieta, antiga dona da livraria? Seria Jonas, o Rei dos Gatos ou o Luís, o antigo dono do Maravilhas, mas que o maltratava? Isso explicaria o pulo do Maravilhas!? Seria tudo isto um sonho maluco?

– Não te lembras? – insistiu o visitante.

– Cuidado, pode ser um bruxo e soltar uma maldição! – avisou a menina Nela.

– Um perigoso ladrão de gatos! Um perigoso ladrão de livros! – disseram os dois amigos numa só voz.

– Não tenham receio… – e o visitante avançou mais dois passos.

O Liácio sentiu um cheiro familiar e o Maravilhas, também. Brusco, libertou-se do colo da Nela e, para espanto de todos, não fugiu. Foi enroscar-se nas pernas da figura sinistra. A figura assobiou. Seria uma espécie de código? Saberia ele falar gatarrês?

– Esta porta permanece cerrada há muito tempo, é verdade… – informou a figura mistério. E prosseguiu – Acho que isto também vos pertence. Os animais encontram sempre passagens secretas para o que mais lhes interessa – disse, abrindo uma caixa de cartão onde ronronavam dois gatos bebes.

As tranças e as sardas foram apanhadas de surpresa. Deveriam aproximar-se?

– Deixe-se de enigmas, afinal quem é o senhor? – perguntou Liácio.

– A sério que não te lembras? Não tenhas medo, não venho tirar nada. Na verdade, venho devolver.

– Livros! Livros! Queremos livros! Livros! Livros! Queremos livros! – esvoaçou o papagaio.

O senhor Liácio temeu que o papagaio lhe roubasse os livros. Mas a figura misteriosa, num gesto vagaroso, meteu a mão dentro do casaco e retirou um envelope. Seria uma carta, um mapa, um livro? Seria a resposta que todos queríamos?

– O nosso livro dos gatos! Histórias, Aventuras e Curiosidades sobre Gatos, é o livro que procurávamos! – exclamou a menina Nela.

O visitante esboçou um sorriso. Mas o enigma prosseguiu até ele exibir a gravata vermelha escondida sob o casaco felpudo.

– Pois é, Liácio… e, isto, também não te lembra nada?

– É… é???

– Sim, sou eu. O teu amigo Timóteo.

– Amigo… e professor! O meu querido professor, que sempre me recomendava livros na biblioteca da escola!

– E te levava à Feira do Livro!

– Sim, sim, como poderia esquecer?! Era nesses dias que punha a gravata vermelha!

– Porque os livros merecem sempre o nosso maior respeito!

Os dois homens soltaram uma gargalhada e deram um forte abraço.

– Como sempre, no fim da tempestade vem a bonança! – lembrou a menina das tranças. A Nela, que também sabia ditados, acrescentou:

─ Estou muito contente por o livro ter aparecido e o nosso Maravilhas não ter desaparecido. Quem procura sempre encontra!

─ Pois sim, meu caro Liácio… ou será que ainda te posso chamar Liáciozinho? Fui teu professor, grande amigo e … sou vizinho desta livraria… esta, não sabias tu! A dona Antonieta, a antiga livreira, era minha tia e morava por cima da loja. Quando faleceu, paz à sua boa alma, deixou-me a casa. Fiquei encantado quando descobri a passagem para a livraria. Mantive a porta fechada à espera do momento certo para te visitar.

─ E porque não o fez antes? Porque nos pregou agora este valente susto?

─ Sabes que também desconfio que os livros desta livraria têm vida própria… e gostava tanto de vos observar!

─ O quê? Afinal era um espião? ─ indignou-se a menina Nela.

─ Só se fosse um espião do bem. Não esqueço o que vi: as visitas da menina na cadeira de rodas – até sei que se chama Madalena! – o rapaz que odiava ler porque os pais o obrigavam ou até a senhora cega… Para todos eles ouvi-te ler com verdadeira dedicação, Liácio.

O Liácio – que agora mais parecia o Liáciozinho – sorriu, envergonhado. O professor Timóteo prosseguiu:

– E acho graça àquele leitor que vem acompanhado do cão salsicha. Por tudo isto, senti que chegou o momento de dar nova vida à livraria. Devolvo agora o livro dos gatos que quiseste vender num leilão. Já nem te lembras? Felizmente, tive essa informação a tempo e consegui comprá-lo! Ou esqueceste que este é um livro raro e precioso que esconde segredos?

– Mas isso foi há muito tempo, quando a livraria estava com dificuldades, após aquele incêndio – desculpou-se o Liácio.

– E agora, não está? Quem aqui entra?

– Nós! – exclamaram as tranças e as sardas.

– Mas vieram para ler ou comprar livros?

– Hummmm, na verdade, foi o gato que…

– Liácio, já se passaram muitos anos, mas nunca esqueci o carinho que tens pelos livros.

– Que aprendi consigo, professor Timóteo!

– Pois então, estamos de acordo. É chegado o momento de dar nova vida à livraria!

– Livros! Livros! Queremos livros! Livros! Livros! Queremos livros! – interrompeu o papagaio verde.

– Podíamos criar um espaço de encontro entre leitores e escritores, onde se inventam e partilham histórias – sugeriu a menina Nela, emocionada.

– Isso! Porque não uma confortável livraria-café? – arriscou o professor Timóteo, viciado em café e livros.

Foi assim que a minha livraria se transformou no ponto de encontro entre quem adora ler e partilhar histórias. Tal como a velhinha Marta, que trazia e levava livros presos com fita-cola com receio de os perder; o famoso Nick, inspetor de livrarias, ou o detetive-menino, Brian, entre tantos outros que nos visitavam apenas para ver as brincadeiras do gato com os gatinhos. Ao som do dlim dlom, entravam pessoas e animais diferentes: até um buldogue francês e um ouriço caixeiro!

Mas também os que gostavam de “viajar” e meditar entre as centenas de livros que habitavam a nossa livraria. O senhor Liácio e a menina Nela atendiam sempre com atenção e cuidado. Orientavam as escolhas e contavam histórias acerca dos livros e autores. Outros visitavam a nova livraria para escreverem as suas próprias histórias. E não me esqueço, não me posso esquecer, daquela menina de olhos verdes, a quem chamamos “guardiã dos livros”. Ela criou uma coleção mágica, inspirada no Gato Maravilhas, que aqui chegou embalada em 20 caixas e pôs a campainha da porta num frenesim – dlim dlom, dlom dlim!

O senhor Liácio, a menina Nela, os dois amigos (agora sei que se chamam Sara Tranças e Afonso Sardas) e o professor Timóteo tornaram-se inseparáveis. Ao final dos dias, cansados mas felizes, sentavam-se à volta da mesa de madeira, colocada junto à passagem secreta. Em algumas tardes tinham a companhia do menino que queria aprender a ler e sonhava ser escritor, e da menina bonita que se perdera, mas que se reencontrara ali, entre novos amigos. Por isso, decidiram mudar a tabuleta afixada sobre a porta de carvalho: “Livraria dos Segredos”. Até o papagaio verde aprendera o som da campainha: dlim dlom, dlom dlim, imitava ele.

Lá fora, no jardim, com lindas flores, o Sol iluminava com uma luz fascinante e ouviam-se os passarinhos a cantar, chilreando de alegria. Tudo fazia parte de um lugar verdadeiramente mágico onde poderia chover sumo de laranja porque simplesmente uma criança assim o imaginou. E escreveu.

Todos estavam felizes. Mas, e eu? Já se esqueceram de mim?

Sou um livro único, raro, mas ainda por editar. Reúno histórias de mais de 50 cabecinhas repletas dos segredos da imaginação. Estou cansado de esperar neste formato desconsiderado, agrafado em folhas A4, que alguém segura nas mãos. Acredito que chegou o momento de ser publicado e reconhecido.

Quero ser lido por muitos, lido por todos!

Por isso, aproveito esta ocasião para relembrar e insistir: será agora, senhor livreiro? Finalmente, poderei contar a minha história?